quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Dentro e fora da barriga. Por Yara Guariglia.


Pensei em mil formas para começar a escrever sobre minha experiência com a maternidade. Pensei em começar pelo planejamento da gestação, pela própria gestação, pelo parto, pela amamentação... e fiquei horas pensando, sem conseguir me decidir por onde começar. Mas depois de  muita reflexão, cheguei a uma conclusão, que serve para o meu depoimento sobre maternidade e para a minha vida: não importa por onde eu comecei, e sim onde vou chegar! E, claro, o percurso também é muito importante.
Esse meu exercício reflexivo em tudo que faço veio no pacote maternidade. Antes eu não era assim, fazia muitas coisas sem pensar ou sem  antes questionar alguns pontos. Hoje, minhas atitudes e decisões acompanham uma lista de porquês e de questionamentos. Cansei de aceitar calada tudo o que a sociedade me impõe. Achava que não tinha disso no mundo materno, mas é onde mais se recebe influência e interferência da sociedade.

A influência, os palpites, as imposições vêm de todos os lados, da mídia, da vizinha, da tia, da prima, da vó, da sogra, da fulana na fila do supermercado e, principalmente, dos “dotô” ou dos metidos a “dotô”. Basta apontar a barriguinha que você já recebe uma enxurrada de informações, em sua maioria, desnecessárias, equivocadas, ultrapassadas e desrespeitosas para com a mãe e com o bebê. Mas são coisas que todo mundo faz e até hoje está todo mundo vivo aí pra provar que “deu certo”. Enfim, comigo não foi diferente.
Recebi aquela enxurrada de palpites e informações, mas aos poucos e dentro de minhas limitações, fui me informando, fui usando a lógica e o instinto e decidi que gostaria de ter um parto normal. A gravidez foi ótima, me lembro perfeitamente de cada movimento que Manuela fazia dentro do meu ventre, me lembro e morro de saudades das horas em que passávamos juntinhas, e a única coisa que eu fazia era acariciar minha barriga para sentí-la. Nada me incomodava, os kilos a mais, as dores pelo corpo, as perebas no rosto, a cara de batata, tudo isso era muito pequeno e insignificante perto do milagre que estava se realizando dentro do meu corpo. Minha gravidez foi MA-RA-VI-LHO-SA.

Sobre o parto, bem, o parto. Na verdade não foi um parto, foi uma cirurgia, a tão sonhada por umas e odiada por outras, a cesárea. Mas isso é história pra outra oportunidade. Tivemos que recorrer a cirurgia pois a Manuela resolveu estacionar na posição pélvica (sentada), dificultando o nascimento via vaginal. O importante foi que ela nasceu. Linda, saudável, mamando desde o centro cirúrgico. E aí começa uma linda história de amor, superação, lutas, vitórias, reflexões e muito instinto, materno e animal. Logo na primeira noite no hospital, pedi que me dessem a Manuela na cama, ela dormiu nos meus braços e mamando. E na segunda noite não foi diferente, dormimos juntinhas e agarradinhas. No dia seguinte ao nascimento, uma “mãezinha” que estava no mesmo quarto me viu acalentando a Manu enquanto meu café da manhã esfriava. Eu estava morrendo de fome, confesso, mas não queria nem saber de deixar a Manu chorando enquanto eu me alimentava, queria mais era acalmá-la, acariciá-la e fazê-la, sentir-se segura. Queria suprir primeiro a necessidade dela. Mas a “mãezinha” me falava: “- Deixa ela chorando no bercinho, se você continuar assim, nunca mais vai fazer nada, vai viver com ela no colo.” Foi aí que meu senso crítico e reflexivo, acompanhados do instinto animal e materno, começaram dar sinais de sua existência.

Na amamentação, que não é fácil, tivemos algumas dificuldades, bicos rachados, bebê mamando e regurgitando sangue dos bicos feridos, hiperlactação (leite demais), refluxo, mas muita paciência. O curso de amamentação que fiz pelo convênio médico durante a gestação foi de grande valia, mas o fundamental foi a minha persistência e a minha humildade em buscar ajuda. Logo no início da amamentação, minha mãe me aconselhou a ligar ao Banco de Leite, pois além de as enfermeiras ajudarem com as dificuldades do início da amamentação, eu poderia doar o leite que estivesse em excesso. Recebi a visita de uma das enfermeiras, ela me explicou muitas coisas e me incentivou a doar o meu leite, pois muitos bebês não podem ou não conseguem mamar em suas mães, principalmente os prematuros. E aí começou mais uma história de amor, mas o amor líquido, doado dentro de vidrinhos. Pra mim era só leite em excesso, mas pra algumas mães e bebês esse leite era e é vida. As dificuldades da amamentação passaram e veio o estado de graça, o vínculo, a troca de carinhos, o prazer, mais e mais amor. Continuo amamentando, em livre demanda, e continuo doando leite. Por motivos de força maior, precisei voltar ao trabalho quando Manu estava com 4 meses e 10 dias. Ouvi de uma pediatra que não poderia mais amamentar quando voltasse ao trabalho. Olha, se eu não tivesse dado ouvidos ao meu instinto e não tivesse buscado informação e reflexão a partir dessa afirmação da “dotôra”, talvez eu não estivesse mais amamentando. Mas eu fui atrás de informações, baseadas em evidências científicas, sabendo que o melhor para minha filha era continuar mamando meu leite e consegui. Estou trabalhando, continuo amamentando em livre demanda, e Manuela continua tomando meu leite no copinho enquanto estou fora de casa. Amamentar, ordenhar, trabalhar, nada disso é fácil. Mas tudo isso me proporciona satisfação, orgulho e a certeza de estar fazendo o melhor pela minha filha.
Ser mãe não é fácil, maternar não é fácil, mas ser bebê também não deve ser fácil, por isso achei e acho  necessário dar importância para cada chorinho, para cada sinal que o bebê nos manda. Mudei muitos pensamentos acerca da maternidade depois que me tornei mãe, quebrei muitos paradigmas, questionei muitas coisas, e segui o meu instinto e o meu coração. Conheci a criação com apego e me identifiquei com a maneira de maternar, respeitando a individualidade e as necessidades da minha filha, colocando-a sempre como prioridade nas nossas vidas. Para maternar com consciência, foi preciso fugir das generalizações, dos métodos infalíveis e das dicas “certeiras” do tempo da vovó. É preciso refletir diariamente sobre as imposições e práticas sociais para a criação dos filhos consideradas normais e reproduzidas há anos. É preciso refletir sobre tudo aquilo que você ouve e vê. É preciso aprender a dizer não, muito mais para os outros do que para o seu filho. É preciso ouvir o seu coração, é preciso seguir o seu instinto, mas o instinto animal que nos acompanha, não aquele “instinto” que já sofreu muitas interferências. E é isso que tenho feito e até agora tem dado certo. Ouço que sou/estou radical, muito natureba, neurótica, que não posso criar a minha filha dentro de uma bolha, que precisamos nos acostumar a ficar separadas, que isso e que aquilo. Mas o meu coração de mãe não me disse nada disso, o meu instinto animal e materno não me fizeram sentir nada disso. O meu coração me diz que estou no caminho certo e que esse caminho, apesar de não ser o mais fácil, é o mais prazeroso pra mim e pra Manuela e ele vai nos levar a uma árvore cheia de bons frutos.


 Yara Guariglia tem 27 anos, é mãe da Manuela Eiko (4 meses e 26 dias), Professora de Educação Infantil e Autora do Blog Dentro e Fora da Barriga. Atualmente, ela reside em Sorocaba/SP. 

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